“A Tradição faz de nós o que somos”, Inês Barbosa

Inês Barbosa

Artesã

In Revista TER 44

Começou a trabalhar com o pai, aos 13 anos, e a sua empresa vai já na quinta geração dedicada à arte da ourivesaria. Assumindo a tradição como pedra basilar do seu trabalho, Inês Barbosa, artesã da Póvoa de Lanhoso, tem sabido aliar memória e modernidade, respeito pelo passado e inovação. A distinção como Mestre de Excelência da Arte e Técnica da Filigrana pelo Luxury Design Craftamanship Summit, em 2019, mais não fez do que reconhecer um percurso de excepção ao serviço da cultura portuguesa.

 

A Póvoa de Lanhoso tem uma tradição da arte da ourivesaria com mais de 2000 anos. Que condições propiciaram o desenvolvimento da ourivesaria nesta vila?

Não se sabe concretamente a origem da filigrana e do granulado, duas grandes técnicas da ourivesaria portuguesa. Crê-se que terão sido trazidas pelos antigos fenícios nas suas rotas comerciais, assim como as levaram para outros vários e longínquos pontos no Mundo. As condições que propiciaram o seu desenvolvimento na vila são, por isso, difíceis de identificar. Ainda porque a documentação referente ao trabalho em ourivesaria ao longo dos séculos é escassa. Contudo, uma das condições que proporcionam a sua continuidade diria ser o transmitir do conhecimento do ofício de geração em geração, mantendo a arte viva no seio da família.

 

Quais são as peças clássicas da ourivesaria que se faz na Póvoa de Lanhoso?

Na Póvoa de Lanhoso fabricam-se todo o tipo de peças clássicas da Ourivesaria Tradicional Portuguesa, entre elas, claro, o Coração Minhoto (ou de Viana), as Arrecadas (ou Bambolinas), os Brincos à Rainha, os Relicários (ou Custódias), as Laças, os Aros de Libra, entre muitas mais. Inclusiv,e e em particular, é o caso das Contas Minhotas (ou Contas de Viana) sendo a Póvoa de Lanhoso o único núcleo de fabrico de ourivesaria que as faz.

 

A tradição é assumida pela vossa empresa como um autêntico pilar. Porquê essa opção?

A nossa visão é preservar a arte e as suas técnicas aliadas, claro, à contínua procura pela inovação e com os olhos postos na atualidade. A Filigrana é uma arte e técnica ancestral de trabalhar os materiais nobres num fabrico manual e a sua história, tradição e uso estão enraizados em Portugal, especialmente na região do Norte do país. A tradição faz de nós o que somos, enquanto pessoa individual e enquanto povo.

 

Por isso assumem o propósito de aliar tradição e inovação, técnica tradicional e design contemporâneo? Como se consegue esse casamento?

A inovação tecnológica recai apenas na preparação dos materiais, isto é, no derreter do material nobre e no puxar o fio, processos que, antigamente, sem recurso a estas novas tecnologias, eram extremamente morosos. As novas tecnologias na preparação dos materiais permitem acelerar o processo de fabrico para que consigamos responder às necessidades deste mundo industrializado sem comprometer as técnicas manuais e ancestrais que caracterizam esta arte. Nunca separados das técnicas ancestrais, existe uma contínua procura pela inovação dos desenhos, criando joias únicas com um design contemporâneo com recurso aos processos de fabrico manual que caracterizam a arte.

 

Começou a trabalhar com o seu pai aos 13 anos, funda a empresa em 1993, tem um longo e prestigiado percurso como artesã. Que momentos destaca nesse percurso?

Não é fácil destacar um momento isolado, são muitos os que caracterizaram o meu percurso e que definiram onde estou hoje. Talvez dos mais marcantes tenham sido os vários convites televisivos para falar sobre a minha empresa e o meu ofício, o prémio de “Mestre na arte e técnica da Filigrana” em 2019, e acima de todo, quando compreendi que mantinha alguns dos mesmos clientes desde o início da empresa.

 

Fale-nos um pouco das técnicas do granulado e da filigrana que são o foco principal da vossa produção.

A Filigrana e o Granulado são técnicas e artes milenares da Ourivesaria Portuguesa, transmitidas de geração em geração, de trabalhar o ouro ou a prata. Os seus processos manuais exigem dos artesãos um trabalho de grande destreza e atenção aos detalhes, uma perfeição que requer anos de experiência e dedicação.

Os principais aspetos que caracterizam a filigrana são a sua manualidade, o entrelaçar de dois finíssimos fios com a ajuda de duas tábuas de madeira, o preenchimento do esqueleto da joia com o fio de filigrana, introduzindo os vários fios individualmente lado a lado. Os principais aspetos que caracterizam o granulado são também a sua manualidade, a decoração de uma chapa lisa com pequenos comprimentos de fio torcido à mão de várias formas e granitos (pequenas bolas), ambos colocados sob a chapa individualmente.

 

Já se referiu a esta situação. Mas deixe-nos insistir. Que significado teve para si o reconhecimento como Mestre de Excelência da arte e técnica da filigrana pelo Luxury Design Craftamanship Summit 2019?

Para mim foi uma enorme surpresa e o reflexo de muitos anos de trabalho árduo e de muita dedicação, um grande orgulho no meu percurso.